sábado, 29 de outubro de 2016

O L I V R O A P Ó C R I F O D E B A R U C

O    L I V R O    D E    B A R U C

Baruc ou Baruque ou Baruk ben Neriá é um personagem bíblico, sendo também o nome de um dos livros deuteronômicos não um apócrifo, (assim considerados pela igreja católica romana) do Antigo Testamento da Bíblia, cuja autoria é atribuída ao próprio Baruque, que não era um simples escriba, mas um sofer, um alto funcionário da administração babilônica na Judéia. Baruque teria sido um homem erudito e de família nobre, que foi secretário de Jeremias durante o Exílio do povo de Israel na Babilônia.  Filho de Nerias, irmão de Seraías, amigo e secretário do profeta Jeremias (Jr 36:4 ss). Era homem erudito, de nobre família (Jr 51:59 ss), tendo servido fielmente ao profeta. Pelas instruções de Jeremias, escreveu Baruque as profecias daquele profeta, comunicando-as aos príncipes e governadores. E um destes foi acusar de traição o escrevente e o profeta Jeremias, mostrando ao rei, como prova das suas afirmações, os escritos, de que tinham conseguido lançar mão. Quando o rei leu os documentos, foi grande o seu furor. Mandou que fossem presos os dois, mas eles escaparam. Depois da conquista de Jerusalém pelos babilônios (586 a.C.), foi Jeremias bem tratado pelo rei Nabucodonosor- e Baruque foi acusado de exercer influência sobre Jeremias a fim de não fugirem parao Egito (Jr 43:3). Mas, por fim, foram ambos compelidos a ir para ali com a parte remanescente de Judá (Jr 43:6). Durante o seu encarceramento deu Jeremias a Baruque o título de propriedade daquela herdade que tinha sido comprada a Hanameel (Jr 32:8-12).

SEU LIVRO
A obra possui seis capítulos, sendo que a autoria dos cinco primeiros é tradicionalmente atribuída à Baruque, enquanto que a autoria do sexto é atribuída a Jeremias.
A obra tem por objetivo mostrar como era a vida religiosa daquele povo, seus cultos e tem o mérito de conservar o sentimento religioso dos israelitas dispersos pelo mundo todo após a ruína de Jerusalém e a perda de quase todas as suas instituições. Mostra como eles conservaram viva a consciência de ser um povo adorador do verdadeiro Deus. Ao mesmo tempo, mostra a consciência que tinham do desastre nacional: não atribuem tudo isso à infidelidade de Javé; ao contrário, reconhecem que os males se originaram por culpa deles próprios: estão assim porque desprezaram a palavra dos profetas, rejeitaram a justiça e a verdadeira sabedoria. Mas, ao lado dessa consciência de seus pecados, conservam uma viva esperança, pois acreditam que Deus não abandona o seu povo e continua fiel às promessas. Se houver arrependimento e conversão, poderão confiar no perdão divino: serão reunidos de novo em Jerusalém, que é para sempre a cidade de Deus.
A carta do capítulo sexto é uma carta que nos leva aos templos pagãos, cujos ídolos estão empoeirados e carcomidos de cupim. Esses ídolos, apresentados de forma atraente e grandiosa, não têm vida, nem são capazes de produzir vida: "Não podem salvar ninguém da morte e nem podem livrar o fraco da mão do poderoso. Não são capazes de devolver a vista ao cego nem de livrar um homem do perigo; não têm compaixão pela viúva nem prestam qualquer ajuda ao órfão. Esses deuses de madeira prateada ou dourada parecem pedras tiradas do morro: quem se ocupa deles só vai passar vergonha. Como, então, pensar ou dizer que são deuses?" (Br 6:35-39).

ESTRUTURA DO LIVRO
O Livro de Baruc é composto de textos com gêneros literários diferentes que não devem ser nem do mesmo do autor e nem da mesma época.
Pode-se dividir a obra em cinco partes:
1. Capítulo 1:1-14: faz uma descrição da origem da obra, uma introdução (em prosa);
2. Capítulos 1:15 a 3:8: há confissão dos pecados de Israel (1:15-2:10) e suas orações, pedindo perdão (2:11-3:8), foi escrita originalmente em hebraico (em prosa), e desenvolve a oração de Dn 9:4-19 .
3. Capítulos 3:9 a 4:4: Os profetas exortam o povo a parar de cometer erros e seguir os mandamentos dados (em poesia, no estilo dos livros sapienciais).
4. Capítulos 4:4 a 5:9: O povo recebe por meio dos profetas a promessa de que será liberto do cativeiro (em poesia).
5. Capítulo 6: Jeremias diz que o povo está idolatrando e que deve parar com isso (Carta de Jeremias - em poesia), na Septuaginta este capítulo é um livro a parte, enquanto que na Vulgata e nas Bíblias Católicas é o capítulo 6 do Livro de Baruc, parece ter sido escrita originalmente em hebraico e 2Mc 2:1-3 parece referir-se a ela.

Alguns capítulo dos livros de Baruque são conhecidos por nomes individuais:
1 Baruque: Livro de Baruque.
2 Baruque: Apocalipse siriaco de Baruque. Os capítulos 78-87 são também conhecidos por Carta de Baruque à tribo dos nove e meio.
3 Baruque: Apocalipse de Baruque ou Apocalipse grego de Baruque.
4 Baruque: Paralipomena de Jeremias aparece como título em diversos manuscritos antigos gregos deste capítulo, significando "coisas deixadas de fora de (do livro de) Jeremias ".

AUTORIA
Embora a introdução (1:1-14) sustente que foi escrito por Baruc e enviado a Jerusalém para ser lido nas assembléias litúrgicas, há estudos que indicam que os textos não foram escritos pelo próprio Baruc, o secretário de Jeremias, e que, provavelmente, foram escritos no século II AC ou em meados do séc I AC.

Discípulo de Jeremias, Baruc é tradicionalmente reconhecido como o autor do livro Deuterocanônico que leva o seu nome. Foi filho de Nerias (Jeremias 32:12; 32:16; 16 : 4, 8, 32; Baruc 1:1), e provavelmente irmão de Saraias, chefe camareiro do Rei Sedecias (Jeremias 32:12, 51:59; Baruc 1:1). Depois que o Templo de Jerusalém foi saqueado por Nabucodonosor (599 A.C.), Baruc escreveu o oráculo do grande profeta Jeremias, sendo ditado por este, e leu o escrito para que o povo judeu, arriscando sua vida por causa disso. No escrito era previsto o retorno dos babilônicos. Ele também escreveu a segunda e mais longa edição das profecias de Jeremias após a primeira ter sido queimada pelo enfurecido rei Joaquim (Jeremias: 36).
Durante sua vida, Baruc permaneceu fiel aos ensinamentos e ideais do grande profeta, apesar de em alguns momentos ter se deixado levar por decepções e ambições pessoais (Jeremais, 45). Ele estava com Jeremias durante o cerco a Jerusalém e testemunhou a compra do terreno ancestral de Anatot (Jeremias, 32). Depois da queda da Cidade Santa e dá destruição do Templo (588 A.C.), Baruc provavelmente viveu algum tempo com Jeremias em Masphath. Foi acusado por seus inimigos de sugerir ao profeta a aconselhar os Judeus a permanecerem em Juda, ao invés de iram para o Egito (Jeremias, 43), onde, de acordo com a tradição Hebraica preservada por São Jeronimo (Isaiah 30: 6, 7), os dois morreram antes de Nabucodonosor invadir aquele país. Entretanto, essa tradição entra em conflito com a informação encontrada no capítulo de abertura da Profecia de Baruc, onde é dito que ele escreveu este livro na Babilónia, e o leu publicamente 5 anos depois da queima da Cidade Santa. Aparentemente o livro foi enviado para Jerusalém por Judeus cativos dentro de um vaso sagrado como um presente destinado ao sacrifício no templo de Yahweh. Essa informação entra em conflito com várias tradições, tanto judias quanto cristãs, mas provavelmente contém algumas partes de verdade que não permitem determinar a data, local ou maneira em que Baruc morreu.
Na Bíblia Católica, “A Profecia de Baruc” é formada por 6 capítulos, último intitulado “Epístola de Jeremias” não pertence propriamente ao livro. A Profecia abre com uma introdução histórica (1: 1-14), estabelece primeiro (versos 1-2) que o livro foi escrito por Baruc na Babilónia, 5 anos após Jerusalém ter sido queimada pelos Caldeus. Em seguida (versos 3-14) deixa claro que foi lido na presença do Rei Jeconias e de outros em exílio na Babilônia, o  que resultou em efeitos benéficos. A primeira parte do corpo do livro (1:15; 3:8) contém a confissão dos pecados que os levaram ao exílio (1:15-2:5; 2:6-13), juntamente com uma prece a Deus para o perdão do Seu povo (2:14; 3:8). Enquanto a primeira parte é muito parecida com o Livro de Daniel (Daniel 9:4-19), a segunda parte de Baruc (3:9; 4:4) se assemelha à passagens em Jó 28, 38. É um belo louvor à Sabedoria Divina, que não se encontra em nenhum outro lugar a não ser na Lei dada a Israel; somente com o disfarce da Lei é que a Sabedoria apareceu no mundo e se tornou acessível ao homem, o que leva, portanto, Israel a provar novamente sua fidelidade a Lei. A última sessão do Livro de Baruc se estende de 4:5 até 5:9. É formada de 4 odes, cada um começando com a expressão “Tenha coragem” (ou “Tenha melhor animo” dependendo da tradução) (4:5, 21, 27, 30), e com um salmo muito semelhante ao décimo primeiro Salmo apócrifo de Salomão (4:36; 5:9). O capítulo 6 apresenta, como apêndice, todo o livro “A Epistola de Jeremias”, enviada pelo profeta “para aqueles que foram levados cativos à Babilónia” por Nabucodonosor. Devido aos seus pecados, os judeus foram levados para a Babilónia onde deveriam permanecer “ali muitos anos, e largos tempos, até sete gerações”. Naquela cidade herege deveriam testemunhar a bela adoração dada aos “deuses de ouro, e de prata, e de pedra, e de madeira”, mas nunca deveriam se conformar com aquilo. Todos esses deuses, demonstrado com vários argumentos, são impotentes e perecíveis, obras da mão de homens, eles não podem fazer nem mal nem bem, assim eles não são deuses de jeito algum.
É certo que o sexto capítulo de Baruc é distinto do resto da obra. Além do título especial, “A Epistola de Jeremias”, o estilo e conteúdo provam se tratar de um escrito independente da Profecia de Baruc. Em alguns manuscritos gregos Baruc não tem a “Epístola”, em outros, entre os melhores, ela está separada do Livro de Baruc e é apresentada imediatamente depois de Lamentações de Jeremias. O fato de o sexto capítulo de Baruc levar o título de “Epistola de Jeremias” tem sido entendido, e ainda é por muitos, o motivo definitivo de que o grande profeta é o autor. É também instigante a vívida e precisa descrição do esplendido, mas infame, culto aos deuses babilónicos em Baruc, feita pelo escrito tradicional, em Jeremias 13:5-6, provavelmente se referindo a dupla jornada de Jeremias ao Eufrates. Finalmente, afirma-se que um certo número de características hebraicas podem ser reconhecidas, levando a um original hebraico. Contrário a esta visão tradicional, a maioria dos críticos contemporâneos argumenta que o estilo grego de Baruc prova que ele foi originalmente escrito em grego e não em hebraico, consequentemente, Jeremias não seria o autor da Epístola com seu nome. Por causa disso e por outras razões observadas no estudo do conteúdo de Baruc, eles acreditam que São Jeronimo estava decididamente correto quando descreveu como uma pseudoepígrafe, ou seja, escrita com um nome falso. No entanto, um importante estudo do Canon das Sagradas Escrituras prova que, a despeito das contestações dos protestantes, Baruc 6 sempre foi reconhecido pela Igreja como um livro inspirado.
Em relação à linguagem original do Livro de Baruc (capítulos 1-5), uma variedade de opiniões permanecem entre os estudiosos. Naturalmente aqueles que se apegam simplesmente ao título admitem que toda a obra foi originalmente escrita em hebraico. Do contrário, a maioria dos que questionam ou rejeitam o título do livro acreditam que a obra foi escrita totalmente, ou pelo menos parcialmente, em grego. É verdade que características literárias gregas aparecem em várias sessões e não apontam para um texto original em hebraico, mas não é difícil se supor que o texto completo de Baruc seja uma tradução, aqui algumas evidências linguísticas que confirmam está última suspeita:
- É muito provável que Teodotio (final do segundo século da nossa era) traduziu O Livro de Baruc de um original hebraico.
- A alguma notas do texto Siro-Hexaplar declaram que algumas palavras no texto grego não são encontradas no texto hebraico.
- Baruc 1, 14 diz que o livro foi feito para ser lido em público no Templo, sendo assim ele deve ter sido composto com esse propósito.
Além disso, em relação a sua linguagem original, Baruc apresenta uma certa unidade em relação a seu tema, de modo que aqueles que acreditam que todo o texto seja um escrito primitivo hebraico admitem que ele é uma unidade de composição. Entretanto, há no Livro de Baruc muitos traços de um processo de compilação, onde várias partes foram aparentemente unidas. A diferença da forma literária entre 1-3:8 e 3:9-5 é grande e, observando-se a maneira abrupta como o panegírico sobre Sabedoria é introduzido em 3:9, sugere que tenham origens diferentes. A duas confissões dos pecados que levaram ao exílio em 1:15, 3:8, são colocadas lado a lado sem nenhuma transição natural. As diferenças literárias entre 3:9-4:4 e 4:5-5:9 são consideráveis e o início da terceira sessão em 4:5 não é menos abrupta do que o da segunda em 3:9. Novamente, a introdução histórica parece ter sido composta somente para o prefácio de 1:15-2:5. Em vista desses e de outros fatos, os críticos contemporâneos geralmente entendem que a obra é fruto de um processo compilatório e que sua unidade é fruto do editor final, que juntou os vários documentos sobre o enfado do exílio. Este método de composição literário não necessariamente conflita com a devoção tradicional ao Livro de Baruc, muitos dos escritores sagrados da Bíblia são compiladores, e Baruc pode ser mais um entre eles, de acordo com os estudiosos católicos que admitem o caráter compilatório das obras escritas por ele. Os católicos se sustentam aqui por três pontos:
- O livro é assinado por Baruc em seu título;
-  Sempre foi reconhecido como uma obra de Baruc pela tradição;
- O seu conteúdo não apresenta nada que pudesse ser de um período posterior ao de Baruc, o que seria considerado estranho ao estilo e forma do fiel discípulo e secretário de Jeremias.
Contra está visão, não-católicos argumentam:
- O seu fundamento é somente o título do livro;
- O título em si não está em harmonia com o conteúdo histórico e literário da obra;
- E parte desse conteúdo, quando examinado imparcialmente, aponta para uma compilação mais tardia do que Baruc; alguns vão mais longe e alegam que a composição foi obra de um escritor do século 70 D.C.
Católicos facilmente desmentem a última data do livro, mas não tão fácilmente refutam as graves dificuldades que foram levantadas contra o seu próprio relato de todo o trabalho a Baruque. Suas respostas são consideradas suficientes por estudioso católicos em geral. Mesmo se, entretanto, julgarem inadequado, por tanto considerarem o Livro de Baruc como um trabalho de um editor tardio, o caráter inspirado do livro permanece, entendendo-se que o último editor foi inspirado em seu trabalho de compilação.
O Livro de Baruc foi definido como escrito “sagrado e canônico” no Concílio de Trento, é tão inspirado por Deus como qualquer outro livro da Sagrada Escritura e pode ser demonstrado com um estudo minucioso do Canon Bíblico. Sua edição em Vulgata Latina remonta a desde antes da versão em Latim antigo de São Jeronimo, e é razoavelmente integral a versão em grego do texto.


O L I V R O A P Ó C R I F O D E E C L E S I Á S T I C O

E C L E S I Á S T I C O

Eclesiástico ou Sirácida é um dos livros deuterocanônicos da Bíblia, de composição atribuída a Jesus filho de Sirach (Jesus Ben Sirac ou Ben Sirá, ou, em grego Sirácida). O livro, formado por reflexões pessoais do autor, era comumente lido em templos cristãos, aliás o nome Eclesiástico (Livro da Igreja ou da Assembléia) provém do uso oficial que a Igreja faz desse livro, em contraposição à Sinagoga judaica, que não o aceita como Palavra de Deus, tal designação vem desde da época de São Cipriano de Cartago. O livro foi originalmente escrito em hebraico, entre 190 e 124 a.C., possui 51 capítulos e, posteriormente, foi traduzido para o grego por um neto de Jesus filho de Sirach, em 123 a.C..
O Eclesiástico é tido como sagrado pelas Igrejas: Católica Romana, Anglicana e Igrejas Ortodoxas. O Eclesiástico é reconhecido no judaismo pelo seu valor histórico; porém, não é parte do Tanakh, o compêndio de livros sagrados da religião. Por esta razão, grupos protestantes não o incluem em seu cânone.
No início do século II a.C., a Palestina passou do domínio dos Ptolomeus (Egito) para o dos Selêucidas (Síria). A fim de unificar o império, exposto a conflitos internos, os selêucidas promoveram uma política de assimilação, e procuraram impor aos povos dominados a cultura, a religião e os costumes gregos - um imperialismo cultural que ameaçava destruir a identidade cultural e religiosa dos dominados.
Parte dos judeus aceitava adaptar o judaísmo a uma civilização mais universal, entretanto outra parte buscava preservar a identidade e salvaguardar a fé e a vocação de Israel, testemunha do Deus vivo para todas as nações. Ben Sirac escreveu então este livro, uma espécie de longa meditação sobre a fidelidade hebraica. Ele procura reavivar a memória e a consciência histórica do seu povo, a fim de mostrar sua identidade própria e o valor perene de suas tradições. O autor, porém, não é intransigente, pois em seu livro mostra ter já assimilado diversos aspectos da cultura grega, iniciando o caminho de uma síntese que culminará no Livro da Sabedoria, ou seja, o livro dirige-se a todo aquele que queria se comportar como judeus em um mundo que mudava, trata-se de uma obra de um conservador lúcido, que quer preservar o essencial, sabendo que não se deve ignorarar as situações novas.
O centro do livro está no cap. 24, em que o autor identifica a Sabedoria com a Lei de Moisés (24,23). Não se trata das leis (= legislação), e sim dos cinco livros do Pentateuco que, em hebraico, se chamam Torá = Lei. Esta, na visão do autor, constitui a Sabedoria de Israel. Com efeito, a narração toda do Pentateuco mostra a experiência básica de todo homem e de qualquer povo: a sabedoria que nasce da experiência concreta e conduz à vida.

EXISTÊNCIA DO TEXTO EM HEBRAICO
São Jerônimo afirmava tê-lo conhecido em sua língua original, aproximadamente dois terços de uma antiga cópia do texto em hebraico provenientes de uma Sinagoga no Cairo foram encontrados em 1896, alguns fragmentos foram encontrados nas grutas de Qumrã (Manuscritos do Mar Morto) e outros fragmentos foram encontrados em Massada.

O livro do ECLESIÁSTICO coloca ao tradutor e ao leitor vários problemas difíceis. É um livro muito usado no judaísmo; especialmente citado no Talmud, exerceu bastante influência na liturgia judaica (festa do Grande Perdão; Oração das 18 Bênçãos). Apesar de ser estimado e usado pelos cristãos e de fazer parte da coleção dos livros religiosos em Alexandria, os cristãos dos primeiros séculos tiveram alguma hesitação em relação a ele, provavelmente por causa da história complicada da sua transmissão e pelo fato de não ter sido integrado no Cânon judaico. É, portanto, um livro Deuterocanónico.

NOME 
Desde os primeiros séculos do Cristianismo até há pouco tempo, o nome mais comum para designar este livro era "Eclesiástico" (do latim "Ecclesiasticus liber"), o que significa o livro da igreja ou da assembleia, por antonomásia. São Cipriano, falecido em 248, parece ter sido o primeiro a usar esse nome, devido ao uso que dele se fazia na Igreja antiga. Com efeito, de entre os Livros Sapienciais, é este o mais rico de ensinamentos práticos, apresentados de um modo paternal e persuasivo.

Apesar de se lhe chamar também "Sirácide", derivado de uma forma alternativa de "Sira", os principais manuscritos gregos usam o título de "Sabedoria de Jesus, filho de Sira" (51,30), ou então, "Sabedoria de Sira". Porque o texto considerado pela Igreja como canônico é o grego, parece aceitável a adoção moderna de livro de "Sirácide" ou de ECLESIÁSTICO como título, apesar da longa tradição do uso de " Ben Sira".

AUTOR E DATA
Excetuando os escritos proféticos, é este o único livro do Antigo Testamento do qual temos a certeza de conhecer o autor: "Sabedoria de Jesus, filho de Sira", como vem assinalado no fim, em jeito de assinatura (51,30; ver 50,27). Segundo muitos autores, terá assinado a sua própria obra, por influência helenística.

Jesus Eclesiástico, ou Sirácide, terá vivido em Jerusalém (50,27) no início do séc. II a.C., como se pode deduzir do louvor que faz a Simão, Sumo Sacerdote (50,1-21). Para a identificação de tal Simão com Simão II é decisiva a notícia que nos é dada pelo tradutor grego da obra, filho ou neto do autor, que escreve por volta de 132 a.C., correspondente ao ano 38 de Ptolomeu VII Evergetes (ver Prólogo).

O livro deve ter sido escrito por volta de 180 a.C. e antes da trágica situação que começa com a destituição de Onias III, filho de Simão, em 174 a.C., a quando da violenta perseguição de Antíoco Epifânio (175 a.C.) e da consequente sublevação dos Macabeus (167 a.C.). O próprio ECLESIÁSTICO nos fornece alguns dados sobre a sua identidade e o seu trabalho. Em 51:23 fala da própria escola e convida os ignorantes a inscreverem-se para poderem adquirir gratuitamente a sabedoria (51:25).

O período em que ECLESIÁSTICO compõe a sua obra e estabelece, na sua própria casa, uma escola de formação sapiencial, está profundamente marcado por uma forma de civilização que se chama "helenismo." É uma forma nova de vida, cuja expansão no Médio Oriente ocorreu depois de Alexandre; caracterizava-se essencialmente pela convivência de culturas, pelo sincretismo religioso, por um universalismo que tende a abolir as fronteiras de raças e de religião, pela glorificação das forças da natureza e pelo culto do homem.

Perante o dinamismo e a expansão sempre crescente do helenismo na própria Palestina, o judaísmo começou a sentir ameaçada a sua própria existência. E ECLESIÁSTICO, apesar da sua abertura de espírito em relação a certos valores do mundo grego, toma consciência de que esse novo movimento de ideias e de costumes se opõe a certas exigências fundamentais da religião judaica (2:12-14). Com outros judeus piedosos, pressente o fim da coexistência pacífica entre o helenismo e o judaísmo e prevê o momento da cisão entre as duas visões diferentes do mundo.

Em 198 a.C., depois da batalha de Pânias, a Palestina passou do domínio dos Ptolomeus do Egito para uma outra, mais hostil, dos Selêucidas de Antioquia da Síria. Antíoco III (223-187) e o seu sucessor Seleuco IV (187-175) ainda foram bastante favoráveis aos judeus, concedendo-lhes privilégios e isenções, contribuindo até, pessoalmente, para as despesas do culto no templo (2 Mac 3:3). Mas a situação política precipitou-se rapidamente com Antíoco Epifânio (175-164), que, devido ao jogo de influências, destituiu Onias III do cargo de Sumo Sacerdote e desencadeou uma violenta perseguição contra os seus opositores.

Esta situação política posterior a Eclesiástico, aliada à situação religiosa e cultural acima descrita, viria a provocar a sublevação judaica chefiada pelos Macabeus. Foi precisamente perante a invasão avassaladora do helenismo que ele escreveu para defender o patrimônio religioso, histórico, sapiencial e cultural do judaísmo, a sua concepção de Deus, do mundo e da eleição privilegiada de Israel. Neste livro procura convencer os seus compatriotas de que possuem, na sua Lei revelada, a sabedoria autêntica e, por isso, não devem capitular perante o pensamento e a civilização dos Gregos.

TEXTO
Originariamente, ECLESIÁSTICO foi escrito em hebraico; mas esse texto, perdido durante séculos, só foi descoberto a partir de 1896 na velha sinagoga do Cairo, em diversos fragmentos de vários manuscritos medievais. Mais tarde, outros pequenos fragmentos foram encontrados numa gruta de Qumrân. Em 1964 foi encontrado na fortaleza de Maçada, junto ao Mar Morto, um longo texto que abrange 39:27- 44:17, numa escrita do início do século I a.C.. O texto hebraico ainda foi conhecido por São Jerônimo, que faleceu em 419.

Felizmente já havia, pelo menos, uma tradução grega, feita no Egito pelo neto do autor. Foi esta que entrou para a Bíblia grega, sendo depois aceita pela Igreja como texto canônico. O autor da tradução acrescenta-lhe um prólogo. Hoje se reconhecem dois estados do texto hebraico: um antigo, que serviu de base à versão grega feita no Egito por volta de 130 a.C. (texto grego I); outro mais recente, revisto na perspectiva das ideias farisaicas, entre 50 e 150 da nossa era, e utilizado para uma revisão do texto grego, entre 130 e 215 da nossa era (texto grego II). A versão siríaca estará ligada ao texto hebraico revisto.

O texto seguido nesta Bíblia é o tradicional da tradução grega dos Setenta (texto longo), inclusivamente entre os capítulos 30 e 36, onde algumas traduções optam pela ordem da Vulgata e do Siríaco. Colocamos em itálico as passagens do texto longo. Os algarismos entre parênteses correspondem a linhas do texto original.

DIVISÃO
O livro pode dividir-se pelo menos em duas etapas: 1-23 e 24-50, começando cada uma delas por um elogio da sabedoria. Alguns autores apresentam outra divisão, também em duas partes, depois do Prólogo: uma primeira propriamente sapiencial, segundo o gênero e o estilo dos Provérbios (1:1-42:14); e uma segunda, que é mais de meditação sobre as obras de Deus na Criação e na História (42:15-50:29). É a que seguimos nesta edição.

TEOLOGIA
O livro de ECLESIÁSTICO testemunha uma época de transição onde já se começam a esboçar os traços característicos do judaísmo como forma evoluída de religião bíblica. Trata-se de um judaísmo poliforme, onde o próprio cristianismo viria lançar raízes. Mas é diferente da tendência rabínica posterior, a que o ramo preponderante do farisaísmo, especialmente a partir de 70 da nossa era, viria dar um aspecto monolítico.

Do confronto helenismo-judaísmo, ECLESIÁSTICO assimila o que considera bom e compatível com a sua fé; mas rejeita o que se opõe à essência da fé judaica e alerta para os perigos da cultura envolvente e dominante. A respeito do Cânon das Escrituras, o Prólogo menciona já a divisão tripartida "Lei, Profetas e os outros livros" (ver 39:1-3), e o próprio livro cita ou menciona mais ou menos diretamente muitos desses livros sagrados.

O autor faz ainda uma síntese da religião tradicional e da sabedoria comum, à luz da sua própria experiência. O tradutor grego quis tornar este manual de conduta acessível a todos àqueles "que, em terra estrangeira, querem instruir-se, reformar os seus costumes e viver segundo a Lei" (Prólogo). A identificação entre a sabedoria e a Lei de Deus (24,23) é a afirmação mais inovadora e característica de ECLESIÁSTICO, tal como é inovadora a inserção da História no gênero sapiencial.

A série de personagens da História de Israel, cujo relato se apresenta na parte final do livro (44:1-50:21), tem o objetivo pedagógico de despertar o orgulho em pertencer a um povo de grandes homens. Porque eles seguiram a palavra de Deus com toda a fé e coragem e foram bem sucedidos. É uma lição para o povo e serão sempre lembrados na posteridade.

ECLESIÁSTICO
Defende a fé tradicional do seu povo: Deus é eterno e único (18:1; 36:4; 42:21), é autor de uma criação perfeita, apesar dos seus mistérios e contradições aparentes (42:21,.24); e, diante dela, o próprio Eclesiástico, como o salmista, enche-se de um especial entusiasmo (39:12-35; 42:15-43:33). Deus tudo conhece (42:15-25); "Ele é tudo" (43:27), governa o universo com justiça e prudência (16,17-23) e retribui com equidade (33:13); é misericordioso, capaz de perdoar e de salvar no tempo da aflição (2:11); é Pai, não apenas de Israel, de quem é o Deus único (17:17-18; 24:12), mas também de cada indivíduo (23:1). Esta concepção constitui um progresso considerável na teologia do judaísmo.

PRÓLOGO DO TRADUTOR GREGO

(1)"Muitos e excelentes ensinamentos nos foram transmitidos pela Lei, pelos Profetas, e por outros Escritos que se lhes seguiram; e, por causa disso, convém louvar Israel pela sua instrução e pela sua sabedoria. E, como não se deve aprender a ciência apenas pela leitura, é preciso que os amigos do saber possam também ser úteis aos de fora, tanto por palavras como por obras escritas.

Foi por isso que Jesus, meu avô, depois de se ter aplicado com afinco ao estudo da Lei, dos Profetas (10)e dos outros Livros dos nossos antepassados, e tendo adquirido neles uma grande ciência, quis também escrever alguma coisa de instrução e de sabedoria, a fim de que as pessoas desejosas de aprender, familiarizando-se com essas coisas, pudessem progredir ainda mais em viver segundo a Lei.

(15)Sois, portanto, convidados a ler este livro com benevolência e atenção, e a ser indulgentes pois, não obstante todo o engenho com que nos aplicamos, (20) parece não termos conseguido traduzir adequadamente a ênfase de certas expressões, porque as coisas ditas em hebraico perdem muita da sua força, quando traduzidas em língua estrangeira. E isto não acontece somente com este livro, pois também a Lei, os Profetas (25) e os outros Livros são muito diferentes, quando se compara a versão com o texto integral.

No ano trinta e oito do reinado de Evergetes, cheguei ao Egito e, tendo ali permanecido algum tempo, observei uma diferença não insignificante na instrução. (30) Por isso, julguei muito necessário trabalhar com cuidado e zelo para traduzir este livro. Durante esse tempo, empreguei muitas vigílias e muita ciência, a fim de concluir e publicar esta obra, para utilidade dos que, em terra estrangeira, querem instruir-se, (35) reformar os seus costumes e viver segundo a Lei."



quinta-feira, 13 de outubro de 2016

O L I V R O A P Ó C R I F O D E S A B E D O R I A

L I V R O    D A    S A B E D O R I A

O Livro da Sabedoria (ou Sabedoria de Salomão) é um dos maiores livros deuterocanônicos da Bíblia. Possui 19 capítulos. É normalmente atribuído a Salomão, porém estudos indicam que foi escrito por um judeu de Alexandria.
Segundo tais estudos, seu autor foi um judeu de Alexandria que escreveu o livro nos últimos decênios do séc I AC, foi o último livro do Antigo Testamento a ser escrito, sendo, portanto, fictícia a atribuição a Salomão.
Alexandria era um importante centro político e cultural grego, e contava com cerca de 200.000 judeus entre seus habitantes. A cultura grega, com suas filosofias, costumes e cultos religiosos, além da hostilidade que, às vezes, incluía perseguição aberta, constituíam uma ameaça constante à fé e à cultura do povo judaico que habitava no Egito. Para não serem marginalizados da sociedade, muitos deixavam os costumes e até mesmo a fé, perdendo a própria identidade para se conformar a uma sociedade idólatra e injusta.
O autor, profundamente alimentado pelas Escrituras e pela consciência histórica do seu povo, enfrenta a situação, escrevendo um livro que procura de todos os modos reforçar a fé e ativar a esperança, relembrando o patrimônio histórico-religioso dos antepassados. Ele ensina a verdadeira sabedoria que conduz a uma vida justa e à felicidade. Não se trata da cultura que se conquista pelo pensamento, mas da sabedoria que vem de Deus, opondo-se à idolatria e à vida injusta que nasce dela. Esta sabedoria divina guiou magistralmente a história do povo de Deus, revelando que a verdadeira felicidade pertence aos amigos de Deus. Em outras palavras, o autor quer mostrar que a sabedoria ou senso de realização da vida não é apenas um fruto do esforço do homem, mas é em primeiro lugar um dom que Deus concede gratuitamente aos seus aliados.
Um dos escritos deuterocanônicos do Antigo Testamento, colocado na Vulgata entre o Cântico dos Cânticos e Eclesiástico.

TÍTULOS
Os títulos mais antigos atribuem o livro a Salomão, o representante hebreu da sabedoria. Na tradução siríaca, o título é: "O Livro da Grande Sabedoria de Salomão"; e no latim versão antiga, o título diz: "Sapientia Salomonis". Os primeiros manuscritos gregos - o Vaticanus, o Sinaiticus, o Alexandrinus - tem uma inscrição semelhante e a dos Padres ocidentais e orientais dos três primeiros séculos geralmente falam de "Sabedoria de Salomão", quando se referindo a quem inspirou o escrito, embora alguns deles usem neste contexto honorífico denominações, tais como ele Theia Sophia (sabedoria Divina), Panaretos Sophia (Toda a virtuosa sabedoria). Na Vulgata, o título é: "Liber Sapientiae", "Livro da Sabedoria". Nas versões não católicas, o título comum é: "Sabedoria de Salomão", em contraposição ao Eclesiástico, que normalmente é intitulado: "a sabedoria de Jesus, o Filho de Sirach".

CONTEÚDO
O livro contém duas partes gerais, os nove primeiros capítulos tratam da Sabedoria sob o seu aspecto mais especulativo e os últimos dez capítulos relacionados com a sabedoria de uma perspectiva histórica. A seguinte linha de pensamento do autor é a especulativa (caps. I-ix). Dirigindo-se aos reis, o escritor ensina que a impiedade é alheia à Sabedoria e castiga aos tribunais da morte (i), e ele expõe e refuta os argumentos contrários dos ímpios: segundo ele, o estado de espírito dos ímpios é contrário ao destino imortal do homem; sua vida está presente apenas no aspecto mais feliz do que o justo; e seu destino final é uma prova incontestável da loucura de seu percurso (ii-v). Ele então exorta os reis de procurar Sabedoria, que é preciso mais para eles do que para o mais comum dos mortais (vi, 1-21) e descreve sua própria experiência feliz na busca e posse da sapiência, que é o esplendor de Deus e é concedida por Ele aos suplicantes sinceros  (vi, 22-VIII). Ele se junta a oração (ix) pelo qual ele próprio pediu que a Sabedoria e Espírito Santo de Deus pudessem ser revelados a ele, e que termina com a reflexão de que os anciãos foram guiados pela Sabedoria - Uma reflexão que faz uma transição natural para a revisão da história antiga de Israel, que constitui a segunda parte de sua obra.  A linha de pensamento do autor nesta parte histórica (ix-xix) também podem facilmente serem apontadas. Ele elogia a sabedoria de Deus (1) para suas relações com os patriarcas de Adão a Moisés (x-xi, 4); (2) para a sua justa, e também misericordiosa, conduta para com os habitantes idólatras do Egito e Canaã (xi, 5-xii); (3) no contraste com a loucura total e a consequente imoralidade da idolatria sob suas diversas formas (xiii, xiv); finalmente, (4), para sua discriminada proteção a Israel durante as pragas do Egito, e na travessia do Mar Vermelho, uma defesa que foi estendido para todos os tempos e lugares.

UNIDADE E INTEGRIDADE
A maioria dos estudiosos contemporâneos admite a unidade do Livro da Sabedoria. Todo o trabalho é permeado por um único e mesmo propósito geral, o de dar um aviso solene contra a loucura da impiedade. Suas duas principais partes estão intimamente ligadas por uma transição natural (ix, 18), que não tem de modo algum a aparência de uma inserção editorial. Suas subdivisões, o que pode, à primeira vista, ser considerado diferente para o plano primitivo do autor, são, quando analisada de perto, partes integrantes deste plano: este é o caso, por exemplo, com a seção relativa à origem e as consequências da idolatria (xiii, xiv), na medida em que esta seção é conscientemente preparada pelo tratamento do escritor da sabedoria de Deus nas suas relações com os habitantes idólatras do Egito e Canaã, na imediata subdivisão anterior (xi, 5 xii). Não só não há rupturas observáveis na realização do plano como as expressões favoritas, se convertem na fala e as palavras individuais se encontram em todas as seções da obra, e apresenta uma prova de que o Livro da Sabedoria não é uma mera compilação, mas uma unidade literária.
A integridade da obra não é menos certa que sua unidade. Cada examinador imparcial da obra pode ver facilmente que nada nela sugere que o livro chegou a nós de outra forma do que em sua forma primitiva. Assim como em Eclesiástico, Sabedoria não tem feito nenhuma inscrição semelhante aos que se abram os livros de Provérbios e Eclesiastes; mas é evidente que, no caso da Sabedoria, como no caso de Eclesiástico, esta ausência não é sinal necessário de que a obra é fragmentada desde o começo. Tampouco pode o livro de a Sabedoria ser considerado com razão como mutilados no final, ao apresentar seu último versículo, finaliza-se adequadamente para o trabalho segundo foi previsto pelo autor. No que diz respeito a algumas passagens da Sabedoria que alguns críticos têm tratado mais tarde como interpolações cristãs (ii, 24; iii, 13; iv, 1; xiv, 7), é claro que foram estas passagens, como se afirma, sua presença não faria viciar a integridade substancial da obra, e ainda, examinando atentamente, que geram um sentido perfeitamente conforme a estrutura judaica da mente do autor.

LINGUAGEM E AUTORIA
Sobre a opinião do antigo título: "Sabedoria de Salomão"; alguns estudiosos têm imaginado que o Livro da Sabedoria foi composto em hebraico, como as outras obras atribuídas a Salomão pelo seu título (Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos). Para fundamentar esta posição apelou-se para os hebraísmos do trabalho; aos seus paralelismos, uma característica distinta da poesia hebraica; ao seu uso constante de partículas simples de ligação (kai, de, gar, oti, etc.), as articulações normais das frases em hebraico; às expressões gregas rastreáveis como eles pensavam as más versões de um original hebreu, etc. Engenhosos como estes argumentos podiam parecer, eles não provam nada mais que o autor do Livro da Sabedoria foi um hebreu, escrevendo em grego com uma distinta adição de espírito judeu. Já em São Jeronimo (Praef. En libros Salomonis), foi considerado que não era hebreu, mas grega era a língua original do Livro da Sabedoria, e este veredicto é tão poderosamente confirmado pelas características literárias de todo o texto grego, que pode muito bem saber que a teoria de um antigo original hebraico, ou de qualquer outra origem que não grego, jamais deveria ter sido mantida a sério.
É claro que o fato de que todo o Livro da Sabedoria foi composto em grego exclui sua autoria salomônica. É verdade que, escritores eclesiásticos dos primeiros séculos comumente assumem esta autoria com base no título do livro, aparentemente confirmado por aquelas passagens (ix, 7, 8, 12; cf. vii, 1, 5, viii, 13 , 14, etc), onde quem fala é claramente o rei Salomão. Mas esta visão da questão nunca foi unânime na Igreja Cristã Primitiva, e no decorrer do tempo, foi sugerida uma posição intermediaria entre a sua afirmação e sua rejeição absoluta. O Livro da Sabedoria, dizia-se, na medida em que é de Salomão, uma vez que se baseia em obras salomónicas que agora estão perdidos, mas que foram conhecidos e utilizados por judeus helenistas séculos após a morte de Salomão. Este ponto de vista intermediário é apenas uma fraca tentativa de salvar alguma coisa da autoria salomônica conforme se afirmou em épocas anteriores. "É uma suposição que não tem argumentos positivos a seu favor, e que, em si, é improvável, uma vez que pressupõe a existência de escritos Salomônicos de que não há nenhum traço, e que teria sido conhecida apenas para o autor do livro da Sabedoria "(Cornely-Hagen," Introd. nos Libros sacros, Compendium ", Paris, 1909, p. 361). Hoje em dia, é livremente admitido que Salomão não é o autor do Livro da Sabedoria, "que foi atribuído a ele, porque seu autor, através de uma ficção literária, fala como se ele fosse o Filho de Davi" (Vigouroux, "Manuel Biblique", II, n. 868 Ver também o aviso prefixo do Livro da Sabedoria, na actual edição da Versão de Douai). Além de Salomão, o escritor a quem a autoria do trabalho tem sido mais frequentemente atribuída é Philo, principalmente no terreno de um acordo geral em relação às doutrinas, entre o autor da Sabedoria e Philo, o célebre filósofo judeu de Alexandria (d. Sobre AD 40).
A verdade do assunto é que as diferenças doutrinais entre o Livro da Sabedoria e dos escritos de Philo são tais que se evite uma autoria comum. O tratamento alegórico de Philo das narrações bíblicas é totalmente alheio à estrutura da mente do autor do Livro da Sabedoria. Seu ponto de vista da origem da idolatria entra em conflitos em vários pontos com a do autor do Livro da Sabedoria. Sobretudo, sua descrição da sabedoria Divina revela como a concepção, o estilo e a forma de apresentação, numa fase posterior, do pensamento do Alexandrino do que a encontrada em Sabedoria. A autoria da obra foi por vezes atribuída a Zorobabel, como se este líder judeu pudesse ter escrito em grego; o alexandrino Aristóbulo (Séc II aC.), como se este cortesão pudesse ter investido contra os reis conforme o Livro da Sabedoria (vi, 1; etc); e, finalmente, a Apolo (Hch 18:24), como se isso não fosse uma mera suposição contrária à presença do livro na Cânon Alexandrino. Todas estas variações acerca da autoria provam que o nome do autor é desconhecido (cf. o anuncio de prefixo a Sabedoria na versão Douay).

LOCAL E DATA DE COMPOSIÇÃO
Quem examina atentamente o Livro da Sabedoria pode facilmente ver que o seu autor desconhecido não era um judeu palestino, mas um judeu Alexandrino. Monoteísta como o escritor tem toda a sua obra, ele evidencia uma familiaridade com o pensamento grego em termos filosóficos (he calls God "the Author of beauty": 13:3; styles Providence pronoia: 14:3; 17:2; speaks of oule amorphos, "the formless material" of the universe, after Plato's manner: 11:17; numbers four cardinal virtues in accordance with Aristotle's school: 8:7; etc.), que é superior a qualquer coisa encontrada na Palestina. Seu excelente grego, suas alusões políticas, a coloração dos detalhes locais, sua clara censura à idolatria egípcia, etc. Alexandria, como um grande centro de população judia e pagã, onde o autor sentiu-se chamado a dirigir a sua eloquente advertência contra a esplêndida e aviltante indiferença ao politeísmo e epicurismo com que muitos de seus colegas judeus tinham sido gradualmente e profundamente influenciados. E esta inferência a partir de dados internos é confirmada pelo fato de que o Livro da Sabedoria não é encontrado no Canon do Antigo Testamento Palestino, mas sim no Alexandrino. Teria se originado na Palestina a sua poderosa acusação de idolatria e seu exaltado ensino relativo à vida futura teria naturalmente obtido para ele um lugar dentro do Canon dos judeus da Palestina. Mas, como ele foi composto em Alexandria, o seu valor foi devidamente apreciado e seu caráter sagrado reconhecido apenas pelos conterrâneos do autor.
É mais difícil determinar a data do que o lugar da composição do Livro da Sabedoria. É universalmente admitido que, quando o escritor descreve um período de degradação moral e injusta perseguição sob governantes injustos que estão ameaçados de julgamentos pesados, ele tem em vista a época de Ptolomeu IV ou Philopator (221-204 aC), ou Ptolomeu VII Physicon (145 -117 aC), pois é somente sob estes depravados príncipes que os judeus egípcios tiveram que suportar a perseguição. Mas é reconhecidamente difícil decidir qual destes dois monarcas, o autor da Sabedoria tinha realmente em vista. É até possível que o trabalho "foi publicado após o desaparecimento desses príncipes, pois de outro modo não teriam aumentado sua raiva tirânica" (Lesêtre, "Manuel d'Introduction", II, 445).

TEXTO E VERSÕES
O texto original do Livro da Sabedoria é preservado em cinco manuscritos unciais (o Vaticanus, o Sinaiticus, o Alexandrinus, o Ephremiticus, e o Venetus) e em dez cursivas (dois dos quais são incompletos). Sua forma mais precisa é encontrado na Vaticanus (século IV), na Venetus (século VIII ou IX), e a letra cursiva 68. As principais obras críticas sobre o texto grego são as de Reusch (Frieburg, 1861), Fritsche (Leipzig, 1871), Deane (Oxford, 1881), Sweete (Cambridge, 1897), e Cornely-Zorell (Paris, 1910). Dentre as versões antigas da Vulgata, que apresenta a versão latina antiga ligeiramente revista por São Jerônimo. São em geral uma estreita e rigorosa tradução do original grego, com adições ocasionais, algumas das quais provavelmente apontam para leituras primitivas que já não existem no grego. A versão siríaca é menos fiel, e do armênio mais literal, que a Vulgata. Entre as versões modernas, a tradução alemã de Siegfried na de Kautzsch "Apocryphen und Pseudepigraphen des AT" (Tübingen, 1900), e a versão francesa do Abbé ponteira (Paris, 1905), merecem uma menção especial.

DOUTRINA DO LIVRO
Como poderia se esperar os ensinamentos doutrinários da redação deste texto deuterocanônico são em essência, as dos outros livros inspirados do Antigo Testamento. O Livro da Sabedoria fala de apenas um Deus, o Deus do universo, e do Senhor dos hebreus. Este Deus é "Aquele que é" (xiii, 1), e sua santidade é totalmente oposta ao mal moral (i, 1-3). Ele é o mestre absoluto do mundo [xi, 22 (23)], que Ele criou para fora da "matéria informe" [xi, 18 (17)], uma expressão platônica, que em nada afirma a eternidade da matéria, mas aponta de volta para o estado caótico descrito em Gênesis 1: 2. Um Deus vivo, Ele fez o homem à Sua imagem, criando-o para a imortalidade (ii, 23), de modo que a morte entrou no mundo só através da inveja do diabo (ii, 24). Sua Providência (pronoia) estende-se a todas as coisas, grandes e pequenos [vi, 8 (7); xi, 26 (25); etc], tendo um cuidado paterno de todas as coisas (xiv, 3), e, em particular, do Seu povo escolhido (xix, 20, ss.). Ele se faz conhecer aos homens através da Sua maravilhosa obra (xiii, 1-5), e exerce sua misericórdia para todos eles [xi, 24 (23), xii, 16; xv, 1], seus próprios inimigos incluído (xii, 8 ss.).
A ideia central do livro é a "Sabedoria", que aparece no trabalho sob dois aspectos principais. Na sua relação com o homem é a sabedoria aqui, como em outros livros sapienciais, a perfeição do conhecimento mostrando-se em ação. É particularmente descrito como residente apenas em homens virtuosos (i, 4, 5), como um princípio solicitando a vontade do homem, como dentro de um dom de Deus (vi, 14, ss.) (Vii, 15; viii, 3, 4), e como concedidas por Ele aos suplicantes sinceros (viii, 21-ix). Através de seu poder, o homem triunfa sobre o mal (vii, 30), e através da sua posse, podem-se garantir para si as promessas de ambos no presente e da vida futura (viii, 16, 13). A sabedoria é para ser valorizada acima de tudo (vii, 8-11; viii, 6-9), e quem a despreza está condenado à infelicidade (iii, 11). Em relação direta com Deus, Sabedoria é personificada, e sua natureza, atributos e operação são nada mais, nada menos do que divino. Ela está com Deus desde a eternidade, o parceiro de Seu trono, e o participante dos Seus pensamentos (viii, 3; ix, 4, 9). Ela é uma emanação de Sua glória (vii, 25), o brilho eterno de Sua luz e o espelho de Seu poder e bondade (vii, 26). A Sabedoria é única, e ainda pode fazer tudo; embora imutável, ela faz novas todas as coisas (vii, 27), com uma atividade superior a qualquer movimento (vii, 23). Quando Deus formou o mundo, esteve presente a Sabedoria (ix, 9), e ela dá aos homens todas as virtudes que eles precisam em cada estação e condição de vida (vii, 27; VIII, 21, x, 1, 21; xi) . A Sabedoria também é identificada como a "Palavra" de Deus (ix, 1, etc), e é representada com eminencia com o "Espírito Santo", a quem uma natureza divina e as divinas operações são igualmente atribuídas (i, 5-7; vii, 22, 23, ix, 17). Doutrinas exaltadas como estas estão em uma conexão vital com a revelação do Novo Testamento sobre o mistério da Santíssima Trindade; enquanto outras passagens do Livro da Sabedoria (ii, 13, 16-18; xviii, 14-16) encontram o seu cumprimento em Cristo, a "Palavra" encarnada, e "a Sabedoria de Deus". Em outros aspectos também, nomeadamente no que diz respeito à sua doutrina escatológica (iii-v), o Livro da Sabedoria apresenta uma preparação maravilhosa para Revelação do Novo Testamento. Os escritores do Novo Testamento parecem perfeitamente familiarizados com os escritos deuterocanônicos (cf. Mateus 27: 42-43, com a Sabedoria 2: 13-18; Romanos 11:34, com a Sabedoria 9:13, Efésios 6: 13-17, com sabedoria 5: 18-19; Hebreus 1: 3, com a Sabedoria 07:26, etc). É verdade que para justificar sua rejeição do Livro da Sabedoria do Canon, muitos protestantes afirmam que em 8: 19-20, o seu autor admite o erro do pré-existência da alma humana. Mas esta passagem discriminada, quando vista à luz do seu contexto, produz um sentido perfeitamente ortodoxo.