L I V R O D E
S A L M O S
SALMOS (do
grego Ψαλμός, Música, pois a palavra que intitula
muitos salmos no texto hebraico é Mizmor מזמור, Músical)
ou Tehilim (do hebraico תהילים, Louvores)
é um livro do Tanakh (fazendo parte
dos escritos ou ketuvim) e da Bíblia Cristã, vem depois do Livro de Jó,
pois este encerra a sequência (AO 1943: seqüência) de livros históricos, e
antes do Livro de Provérbios, iniciando os livros proféticos e poéticos em
ordem cronológica, sendo o primeiro livro a falar claramente do Messias (ou
Cristo) e seu reinado, e do Juízo Final. É o maior livro de toda
Bíblia e constitui-se de 150 (ou 151 segundo a Igreja
Ortodoxa), cânticos e poemas proféticos, que são o coração do Antigo
Testamento, é a grande síntese que reúne todos os temas e estilos dessa parte
da Bíblia, utilizados pelo antigo Israel como hinário no Templo de
Jerusalém, e hoje são utilizados como orações ou louvores, no Judaísmo,
no Cristianismo e também no Islamismo (o Corão no cap.
17, verso 82, refere os salmos como "um bálsamo"). Tal fato, comum
aos três monoteísmos semitas, não tem paralelo, dado que judeus cristãos e
muçulmanos acreditam nos Salmos que foram escritos em hebraico, depois
traduzidos para o grego e latim.
Origens
A autoria da
maioria dos salmos é atribuída ao rei Davi, o qual teria escrito pelo
menos 73 poemas. Asafe é considerado o autor de 12 salmos. Os filhos
de Corá escreveram uns nove e o rei Salomão ao menos dois. Hemã,
com os filhos de Corá, bem como Etã e Moisés, escreveram no
mínimo um cada. Todavia, 51 salmos seriam tidos de autoria anônima.
O período em que
os salmos foram compostos varia muito, representando um lapso temporal de
aproximadamente um milênio, desde a data aproximada de 1440 a.C, quando
houve o êxodo dos Israelitas do Egito até o cativeiro
babilônico, sendo que muitas vezes esses poemas permitem traçar um paralelo com
os acontecimentos históricos, principalmente com a vida de Davi, quando, por
exemplo, havia fugido da perseguição promovida pelo Rei Saul (Salmos 18, 52,
54) e de seu próprio filho Absalão (Salmo 3) ou quanto ao
arrependimento pelo seu pecado com Bate-Seba (Salmo 51).
Poemas de
louvor, os salmos foram inicialmente transmitidos através da tradição oral e a
fixação por escrito teve lugar, sobretudo através do movimento de recolha das
tradições israelitas, iniciado no exílio babilônico pelo Profeta Ezequiel (séculos
VII-VI a.C.). Como tal, muitos destes textos são muito anteriores, sendo
bastante difícil a sua crítica do ponto de vista literário estritos. Ainda
assim, tendo em conta a comparação com a literatura poética coeva do Egito,
da Assíria e da Babilônia, pode-se afirmar que estes poemas
de Israel são
um dos expoentes da poesia universal.
Os salmos, em
termos de conteúdo, possuem estrutura coerente, o que também pode ser observado
em passagens do Antigo Testamento e em obras literárias do Oriente Médio da Antiguidade.
Tal como em
outras tradições culturais, também a poesia hebraica andava estreitamente
associada à música. Assim, embora não seja de se excluir para os salmos a
possível recitação em forma de leitura, "todavia, dado o seu gênero
literário, com razão são designados em hebraico pelo termo Tehillim,
isto é, «cânticos de louvor», e, em gregopsalmói, ou seja, «cânticos
acompanhados ao som do saltério », ou ainda: oração cantada e acompanhada
com instrumentos musicais.
De fato, todos
os salmos possuem um certo caráter musical, que determina o
modo como devem ser executados. E assim, mesmo quando o salmo é recitado sem
canto, ou até individualmente ou em silêncio, a sua recitação terá de conservar
este caráter musical
Os salmos
acabaram por constituir um hinário litúrgico para uso no templo de Jerusalém,
do qual transitaram quer para a sinagoga judaica, quer para as liturgias
cristãs.
Na Igreja
Católica, os 150 salmos formam o núcleo da oração cotidiana: a chamam Liturgia
das Horas, também conhecida por Ofício Divino e cuja organização
remonta a São Bento de Núrcia.
A oração conhecida por rosário, com as suas 150 Ave Marias, formou-se
por analogia com os 150 salmos do Ofício. Outra forma muito popular é
organizar listas de Salmos por finalidade, isto é, salmos para serem rezados em
determinadas ocasiões como festas, doenças, colheitas ou funerais.
Historicamente, a primeira destas listas foi organizada a partir da prática de
Santo Arsênio da Capadócia, que rezava um salmo como uma oração com certas
finalidades.
Os salmos são
também poesia, que é a forma mais apropriada para expressar os sentimentos
diante da realidade da vida permeada pelo mistério de Deus, o aliado que se
compromete com o homem para com ele construir a história. É Deus participando
da luta pela vida e liberdade. Dessa forma, os salmos convidam para que também
nós nos voltemos com atenção para a vida e a história. Nelas descobrimos o Deus
sempre presente e disposto a se aliar, para caminhar na luta pela construção do
mundo novo.
Os salmos supõem
o contexto maior de uma fé que nasce da história e constrói história. Seu ponto
de partida é o Deus libertador que ouve o clamor do povo e se torna presente,
dando eficácia à sua luta pela liberdade e vida (Ex 3,7-8). Por isso, os salmos
são as orações que manifestam a fé que os pobres e oprimidos têm no Deus
aliado. Como esse Deus não aprova a situação dos desfavorecidos, o povo tem a
ousadia de reivindicar seus direitos, denunciar a injustiça, resistir aos
poderosos e até mesmo questionar o próprio Deus. São orações que nos
conscientizam e engajam na luta dentro dos conflitos, sem dar espaço para o
pieguismo, o individualismo ou a alienação.
O livro dos
Salmos é um dos mais citados pelos escritores do Novo Testamento. O
próprio Jesus orava os salmos, e sua vida e ação trouxeram
significado pleno para o sentido que essas orações já possuíam. Depois dele, os
salmos se tornaram a oração do novo povo de Deus, comprometido com Jesus Cristo
para a transformação do mundo, em vista da construção do Reino.
Vários salmos são
considerados pelos teólogos como proféticos ou messiânicos, pois
referem-se à vinda do Cristo e, por isso, existem muitas citações de
versos dos salmistas no Novo Testamento com o propósito de provar o
cumprimento das profecias na pessoa de Jesus.
O Salmo 150
constituiria uma doxologia, ou arremate de louvor do livro.
Variações
entre as Traduções
O livro dos
Salmos chegou até nós em sua versão grega (Septuaginta) e hebraica. A versão
grega deste livro, como de toda a bíblia, foi utilizada pelos cristãos
convertidos e por São Jerônimo na confecção de sua edição “Vulgata",
tradução latina dos livros inspirados. Na Reforma Protestante é que
se buscaram os manuscritos originais hebraicos para fazer novas traduções e foi
constatada a diferença que havia entre as duas traduções: as versões, apesar de
terem o texto completo, diferem na numeração de capítulos e versículos.
Versículos
A versão grega
costuma apresentar, na maioria dos salmos, um versículo de introdução, em que
são atribuídas autorias e apontados instrumentos que deveriam ser utilizados ao
se cantar os textos. Este versículo faz com que a versão hebraica tenha, nesses
casos, um versículo a menos, uma vez que essas informações não são consideradas
inspiradas por essa versão.
Capítulos
Em suma, pode-se
dizer que entre os Salmos 10 e 148, a numeração da Bíblia Hebraica está uma
unidade à frente da numeração seguida na Septuaginta e na Vulgata,
que juntam: os Salmos 9 e 10 no Salmo 9 (da Septuaginta/Vulgata), e, os Salmos
114 e 115 no Salmo 113 (da Septuaginta/Vulgata); e dividem: o Salmo 116 nos
Salmos 114 e 115 (da Septuaginta/Vulgata), e, o o Salmo 147 nos Salmos 146 e
148
(da
Septuaginta/Vulgata).
Veja a tabela
abaixo: .
Texto
hebraico
|
Texto grego
|
1 a 8
|
1 a 8
|
9 e 10
|
9
|
11 a
113
|
10 a 112
|
114 e
115
|
113
|
116
|
114 e 115
|
117 a
146
|
116 a 145
|
147
|
146 e 147
|
148 a
150
|
148 a 150
|
Aplicação
No Judaísmo e
o Protestantismo, a numeração usada sempre foi a hebraica.
A Igreja
Católica, considerando oficial a tradução da "Vulgata", por muito
tempo usou a numeração grega em suas bíblias. Porém, estudiosos consideram
essa numeração errada, uma vez que certos salmos, que parecem ser um só, estão
separados, enquanto outros, de assuntos bem diferentes, estão juntos. Vendo que
a Vulgata era falha ao se basear somente num texto (Septuaginta), e no ínterim
de novas descobertas das Escrituras (Manuscritos do Mar Morto), a Igreja
permitiu a tradução das Escrituras diretamente dos originais (Constituição
Dogmática Dei Verbum) e promoveu uma nova tradução e revisão da Bíblia (Neovulgata),
que, desta vez, trouxe a numeração dos salmos a partir da versão hebraica, mas
não resolveu a questão dos versículos introdutórios. A despeito desta nova
tradução católica, é possível encontrar bíblias católicas que ainda se baseiam
na Vulgata, por seu tradicionalismo, como é o caso da bíblia da Editora
Ave Maria.
Salmos
Proféticos
O Salmo 91 e
muitos outros são considerados proféticos ou messiânicos pela Teologia cristã,
pois apontam para a vinda do Messias, sendo com frequência citados
no Novo Testamento da Bíblia com o objetivo de identificar Jesus
Cristo como o cumpridor da promessa.
No Salmo 2, que
fala do reinado do Ungido de Deus, verificam-se algumas citações no
livro de Atos e na Epístolas aos Hebreus.
Já o Salmo 8 que
fala da glória divina e da dignidade do Filho do Homem é citado no Evangelho
de Mateus, bem como em algumas epístolas de Paulo.
Por sua vez, o
Salmo 16 é uma referência à ressurreição de Cristo em seu verso 10,
quando Davi assim profetiza:
"Pois não
deixarás a minha alma na morte, nem permitirás que o teu Santo veja
corrupção."
Por sua vez, o
Salmo 22 fala do sofrimento e da vitória do Messias que se entende
cumprido na crucificação de Jesus, principalmente devido aos versos 7 e 18
que, respectivamente, coincidem com a zombaria experimentada durante o martírio
e a repartição das vestes pelos soldados.
Todos esses
salmos foram proferidos pelo rei Davi, que teria governado Israel um
milênio antes do ministério de Jesus.
Importante
destacar que tais salmos referem-se à numeração da Bíblia protestante, o que
deve ser observado pelo leitor ao consultar a Bíblia católica, cujo conteúdo é
o mesmo.
Os Salmos e a
História de Davi
Vários salmos
relacionam-se com os acontecimentos que marcaram a vida do rei Davi.
O Salmo 59 tem a
ver com a ocasião em que Saul teria enviado homens à casa de Davi
para prendê-lo. Já os Salmos 34 e 56 referem-se à sua fuga de Saul. Por sua
vez, o Salmo 142 foi composto quando David encontrava-se escondido
na caverna de Adulão, na região do Mar Morto.
Ao terminar a
perseguição de Saul, Davi compõe o Salmo 18, ressaltando a fidelidade de Deus.
Quando é
confrontado pelo Profeta Natã sobre o seu adultério com Bate-Seba e a
morte de Urias, Davi compõe o Salmo 51, demonstrando o seu verdadeiro
arrependimento.
Novamente ao ser
perseguido, agora por seu filho Absalão, Davi ainda escreve os Salmos 3 e
7, o que revela sua confiança no livramento de Deus.
Além destes
citados acima, outros Salmos que se relacionam com passagens da vida de Davi
seriam o 52 (depois que Doengue assassinou os 85 sacerdotes e suas famílias), o
54 (quando os zifeus tentaram traí-lo), o 57 (enquanto se escondia em
uma caverna) e o 63 (enquanto escondia-se no deserto de En-Gedi).
Importante alertar
novamente que tais Salmos referem-se à numeração da Bíblia protestante, o
que deve ser observado pelo leitor ao consultar a Bíblia católica, cujo
conteúdo permanece o mesmo.
O tratamento
musical dos Salmos na Liturgia Cristã
A história do
canto do salmo na liturgia cristã corre paralela à história da liturgia,
da música e das Igrejas cristãs. Após o desenvolvimento do salmo
responsorial no século IV, a função do salmista acaba por se transformar
num ministério próprio, mais tarde incluído até no clero local. No entanto,
este ministério acaba por cair em desuso com a especialização crescente dos
cantores e com a instituição das scholae, ao mesmo tempo em que a
participação do povo se reduz.
Na missa,
o salmo vê-se limitado a um único versículo, nas versões
extraordinariamente elaboradas do gradualgregoriano, assim chamado por ser
cantado dos degraus do altar. No Ofício Divino, o canto dos salmos
recebe também o desvelo de gerações de compositores, que expressamente compõem
algumas das obras-primas da música ocidental, em particular para o solene canto
de Vésperas, como, por exemplo, Vespro della Beata Vergine Maria,
de 1610, de Claudio Monteverdi, ou as Vesperae Solennes de
Confessore, KV 339, de Wolfgang Amadeus Mozard), mas onde muitas
vezes, na prática, a oração cede lugar ao concerto.
Na Igreja Católica,
o moto proprio Tra le Solecitudine de 1903,
do Papa Pio X, exclui da liturgia os salmos "de
concerto". Após o Concílio Vaticano II, é restaurado o salmo
responsorial na missa, através da Instrução Geral do Missal Romano de 1969.
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